HOJE
É O DIA DE TODOS OS DIAS
De Gabriel Tonin
PERSONAGENS
Laila
Duda
Clóvinho
CENÁRIO: UMA FESTA COM DECORAÇÕES DE TODAS AS DATAS
COMEMORATIVAS DO ANO.
CENA
1
TODOS
Tem
dias um tanto carente
Às
vezes nem pareço gente
Tem
dia que nada tem graça
Nem
um rolezinho na praça
Tem
dia que quer se esconder
Em
outros desaparecer
Tem
dias, caramba, que frio!
Não
sei se é novembro ou abril
Com
nossos amigos do lado
Ou
mesmo sozinho e calado
E se
ninguém nem tiver chão
A
gente usa a imaginação
E
o tempo parece parar...
Está
em qualquer poesia
Nos
filmes, nos livros e no tudo
O
tempo que passa num segundo
É
o tempo de montar a mesa.
Aquilo
que sonha a cabeça
Parece
mais livre no escuro
No
palco, na tela do mundo
Nem
sempre é sobre beleza.
História
de amor, realeza
Folclore,
terror, tá na mesa
É
um dia de comemoração.
Mamães
e vovós e os animais
O
dia de um santo ou dos pais
Hoje
é dia de todo dia
É
festa de todo dia
Hoje
é dia de todo dia
É
festa de todo dia
Hoje
é dia de todo dia
É
festa de todo dia!
CENA
2
LAILA
Hoje é o dia mais especial de todos os dias do ano!
Aplausos e assobios e festa!
CLÓVINHO
Pior que parece igualzinho a apresentação de ontem.
Parece até as mesmas pessoas de ontem. Você esteve aqui ontem, não esteve?
Então era seu irmão gêmeo!
DUDA
De qualquer forma é um dia muito especial pra muitas
pessoas! Às vezes vai ter festa, às vezes vai ter bolo, às vezes vai ter música,
às vezes vai ter algodão doce e docinhos de amendoim...
TODOS
E às vezes vai ter festa de teatro!
LAILA
Em comemoração ao dia mais especial de todos os dias
de todos os anos! Nós viemos aqui pra fazer uma festa de teatro especialzinha
pra vocês! Olha que legal!
CLÓVINHO
Gente, me ajuda aqui, eu esqueci. O que a gente tá
comemorando mesmo? É que são tantos dias que eu sempre esqueço.
LAILA
Ai, cara, não acredito! É o meu aniversário, bobo!
DUDA
O que?
LAILA
Hoje é meu aniversário, gente! É o dia mais especial
de todos os dias da minha vida! Eu estou muito feliz com toda essa festa aqui,
com tantos convidados!
DUDA
Não, garota! A gente não veio comemorar o seu
aniversário hoje.
LAILA
Não? Como assim? Por que não?
CLÓVINHO
Peraí! Que mês estamos? Alguém sabe dizer que mês
estamos agora?
(a plateia responde)
DUDA
Exatamente. Estamos no mês de (mês) !
LAILA
Que? Mas meu aniversário é só em (mês) .
DUDA
É porque hoje não é seu aniversário, Laila. Hoje nós
viemos comemorar outra coisa, também muito importante, assim como você!
LAILA
E o que é?
DUDA
Se estamos no mês de (mês) , provavelmente estamos comemorando o dia do...?
LAILA
Sapo!
DUDA
Não! Dia do...?
CLÓVINHO
Cérebro!
DUDA
Não, não tem dia do cérebro, nem dia do sapo!
LAILA
Aaaah, por que não? Coitadinhos dos sapinhos.
DUDA
Quem aí sabe o que a gente tá comemorando, gente?
(a plateia responde)
DUDA
Exatamente, é o dia do __(data comemorativa do mês)___.
LAILA
Ah, meu deus do céu, eu não vejo a hora de encher a pança!
CLÓVINHO
Mas a gente tá comemorando só uma coisa? Por que não
comemora tudo junto? Por que tem que ficar dividindo as pessoas, meu deus?
DUDA
Como assim comemorar tudo junto? Cada um tem o seu
dia especial, Clóvinho. Sempre foi assim.
CLÓVINHO
Exatamente! Eu acho que a gente tinha que fazer um
negócio de ser especial todos os dias!
DUDA E LAILA
Todos os dias?
CLÓVINHO
Todos os dias tinham que ser especial pra comemorar
tudo! Vocês não acham? Todos os dias é dia de todos os dias!
DUDA
Calma, garoto, vamo com calma...
CLÓVINHO
Tudo numa festa só! Pai, mãe, vó, tia, primos,
vizinhos! Tudo! Gato, cachorro, papagaio.
LAILA
Um aniversário pra todo mundo no mesmo dia!
Magnífico!
CLÓVINHO
Isso! É Natal, aniversário dele, aniversário dela,
dia do saci, dia da independência, semana da consciência negra, dia de Nossa
Senhora Aparecida que também é o dia das crianças! Tudo todos os dias!
LAILA
Ai, gente! Que coisa linda! Eu amei! Vamo, vamo?
DUDA
Gostei! Mas gente, pensa só! Se a gente faz isso a
gente vai ter que fazer um festão todos os dias das nossas vidas! Pensem nisso.
(silêncio)
LAILA
Festão de teatro todos os dias?
DUDA
Exatamente. Imagina!
CLÓVINHO
Sem pular nenhum dia?
DUDA
Sem pular nenhum, porque todo dia é dia de alguma
coisa ou aniversário de alguém. Agora imaginem, festa de todos os dias, todos
os dias! Já pensou?
(silêncio)
CLÓVINHO
Já e eu acho uma ideia fantástica!
LAILA
Eu também já imaginei e foi tudo o que eu sempre
mais sonhei! É uma ideia maravilhosa!
DUDA
Eu sei, eu sei. É a ideia mais genial que eu já ouvi
na minha vida inteira também! Confesso. Mas eu fico... eu fico meio...
LAILA
Meio o que?
DUDA
Apreensiva. Ansiosa. Como a gente vai organizar um
evento desse todo santo dia, gente?
LAILA
Calma. A gente ensaiou tudo bonitinho. Vai dar tudo
certo!
DUDA
Eu sei que vai. É que...
CLÓVINHO
É hora de festa!
CENA
3
(eles cantam e brincam com os bonecos
correspondentes)
TODOS
Tudo
começa no primeiro dia
Se
vestir de branco pra pular ondinha
É
o começo do ano que vem sem aviso
Eu
quero conhecer os meus novos amigos
Já
chega o carnaval e eu vou te dar um beijo (oh, oh, oh!)
Só
pode se a moça te beijar de volta
Depois
do carnaval aí começa a escola
E
o dia da mulher é exatamente agora!
A
nossa festa é como é (é como é!)
A
gente aprende quem foi Noé
Quem
foi Cristóvão, também marujo
Quem
foi o índio, que perdeu tudo!
Oh!
Help! Coelhinho da páscoa!
Help!
Festa junina!
Help!
Papai Noel!
Help,
help, help!
E
no dia das mãe a gente ganha um beijo (oh, oh, oh!)
Pode
ser da vovó, ou da professora
É
o dia da família que veio em peso
Papai,
avô, titia, primo, irmão, vizinha!
A
nossa festa ela é assim (ela é assim!)
A
gente aprende desde o jardim
Dia
do folclore, dia dos mortos
E
o Pererê que sorriu pra mim!
Oh!
Help! Meio ambiente!
Help!
Festa junina!
Help!
Combate à dengue!
Help!
Help! Help!
Help!
Os professores!
Help!
Namoradinhos!
Help!
E a mentira!
Help!
Help! Help!
E
o dia das crianças pode ter brinquedos (oh, oh, oh!)
Presentes
que os pais às vezes não tiveram
O
no final do ano a festa é colorida
E depois
do Natal começa a nova vida!
A
nossa vida é como é (é como é!)
A
gente aprende ficar de pé
É
hoje o dia de todo dia
É
hoje o dia de todo dia!
Help!
É hoje o dia!
Help!
Não tem outro dia!
Help!
É hoje o dia!
Heeeeelp!
Help!
CENA
4
DUDA
Socorro, senhor amado! Eu amei! Isso tudo está muito
maravilhoso! Eu acho que eu nunca fiquei tão empolgada na minha vida inteira!
LAILA
Hoje é o aniversário de todo mundo, gente! Parabéns
pra vocês, parabéns pra mim!
CLÓVINHO
Parabéns pra todos nós!
LAILA
Vamo cantar pra quem tá fazendo aniversário todo
dia?
(eles cantam o parabéns pra todos)
DUDA
Caramba, isso foi uma ideia genial! Como é que pode
ninguém ter pensado nisso antes?
CLÓVINHO
Obrigado.
LAILA
Obrigada.
DUDA
De nada.
(silêncio)
DUDA
Tá. Mas e agora?
CLÓVINHO
E agora o quê?
DUDA
O que a gente faz?
CLÓVINHO
O que a gente faz do quê?
DUDA
Eu não sei!
CLÓVINHO
Ué, e eu que vou saber?
LAILA
Eu também não sei.
DUDA
É que... parece que agora... agora como todos os
dias são especiais, parece que todos os dias são especiais e aí nenhum dia é
mais especial que o outro, né.
(silêncio)
LAILA
Hã?
CLÓVINHO
Mas não era esse o objetivo?
DUDA
Mas como pode ser especial se tudo é especial?
Pense: se todos os dias são especiais, então todos os dias estamos na média. A
gente nunca vai ter um dia mais especial que o especial? O especial do
especial?
LAILA
Mas você é fominha, hein? Mal começou os comis e
bebis e você já tá entediada! Calma, mulher.
CLÓVINHO
Todos os dias são especiais igual, Duda.
DUDA
Mas se são iguais, não tem um exatamente que seja especial.
Percebe? Se todos são iguais então estão todos os dias iguais, nenhum especial.
Não tem como a gente medir um dia especial se todos os dias são especiais
igual!
(silêncio)
LAILA
Você me deixou muito confusa.
DUDA
Imagine eu!
CLÓVINHO
A festa não pode parar nunca!
CENA
5
(Clóvinho arruma um microfone)
CLÓVINHO
Só
você
Se
impede de viver
Só
você
Faz
o dia especial
Quer
saber?
DUDA E LAILA
Eu
quero saber.
CLÓVINHO
Deixe
a coisa rolar
E
vai ver
A
vida passar
Mais
devagar
E antes
de partir
TODOS
Você
vai ter vivido um amor
E
todos os dias serão mais feliz
Você
vai ter vivido um amor
E
todos os dias serão mais feliz.
CLÓVINHO
Você
vai ter vivido um amor
E
todos os dias serão mais feliz.
CENA
6
LAILA
Cara, você é muito fofo! Adorei! Obrigada!
DUDA
Eu achei um pouco cafona. Eu só cantei porque a
gente ensaiou assim.
LAILA
Credo, Laila, que mau humor!
DUDA
Não. Desculpe. É que... (pausa)
CLÓVINHO
É que o quê?
DUDA
Ai, é fácil falar! É fácil falar pra gente ficar
feliz, né, gente? Pra gente comemorar todos os dias em todos os dias do ano,
olha que lindo, o mundo perfeito! Do teatro! (pausa) Cheio de maquiagem pra
ficar bonito! É tudo mentira! Tudo sofredor! Eu não quero ser a chata nem nada,
mas é fácil vir falar na cara de todo mundo que “olha, como a vida é linda, vamos
comemorar todos os dias de todas as coisas que tem dia, e vamos fazer uma festa
todo dia, todo dia é carnaval, todo dia é dia das crianças, todo dia muito
feliz, muito animado, muito, muito!” Ai! É muita coisa pra minha cabeça. Se a
gente continuar fazendo aniversário todo dia, daqui a pouco a gente vai ter
trezentos anos. Eu não aguento mais comer ovo de páscoa e nem uva passa no
arroz! Eu engordei três quilos já, três quilos só de paçoquinha! Se eu tiver
que explicar mais uma vez a cor da lata de lixo de reciclagem pra cada
material, eu vou ficar louca!
Eu
entendo que a alegria
Devia
vir junto todo dia
Mas
eu não sei se eu sei ficar em pé
Feliz
assim, não sei o que foi
Mas
aconteceu que eu chorei depois
E
vocês dois não sabem me dizer o que isso é
Eu
queria poder conseguir
Ficar
feliz vinte e quatro horas
Queria
saber
Eu
queria poder ser feliz
Mas
a vida
Tem
coisas
Que
não tem como evitá-las
Quando
alguém querido vai embora
É um
dodói que dói
CLÓVINHO
Eu
entendo
Que
o tempo
É uma
aventura curta
LAILA
O
dia ruim
Pode
vir também
E nada
nos abala, sempre vem alguém
CLÓVINHO
Pra
um carinho, uma conversinha
LAILA
E
a dor vai passaaaaaaar!
LAILA E CLÓVINHO
Ficar
feliz vinte e quatro horas!
DUDA
É
fácil falar!
TODOS
Eu
queria poder conseguir
E depois
a dor do que já passou
Que
se torna
Amor!
(silêncio)
CENA
7
DUDA
Acho que... parece fácil falar. O duro... é aqui
dentro.
CLÓVINHO
Nossa.
LAILA
Amiga, não fica assim.
DUDA
Ai, estou entediada. Não tá tendo nada de especial
aqui. E eu acho que eu tô querendo isso, sabe, porque eu queria que no próximo
domingo fosse um dia especial. No domingo!
LAILA
Domingo? Por que domingo? O que tem domingo?
DUDA
Não sei. Porque sim. Porque... porque eu queria ter
expectativas! Eu quero esperar chegar no domingo e deixar ele ser especial! Mas
se todo dia é especial, eu tenho que fazer os dias até domingo serem dias não
especiais, pra que no domingo eu repare o quanto ele vai ser especial!
Entenderam? Eu sou toda complicada, eu sei.
CLÓVINHO
Duda, só lembre que dá pra gente fazer um dia
especial por ser ruim também. A morte de alguém querido, por exemplo, é uma
data especial, que vai ficar destacada na memória, um dia especial de ruim. Ou
um dia de mau humor que atrapalhe uma festa de teatro.
(Duda desaba num choro doído)
DUDA
Ai, desculpa todo mundo! Eu não sei, eu não sei! É
tudo muito feliz, é tudo muito maravilhoso, mas mesmo assim eu não sei. O que
tem de tão especial? O que tem de errado comigo?
LAILA
Olha pra eles. (aponta a plateia)
DUDA
O que?
LAILA
Olha pra eles! Só olha. Vê?
DUDA
Vejo.
LAILA
A gente tá aqui por isso, viu?
DUDA
Que vergonha.
LAILA
Não, não é!
DUDA
Me desculpem. Às vezes eu esqueço qual parte é
teatro, qual parte é vida real. Desculpem.
CLÓVINHO
Duda, mesmo que na teoria seja fácil de falar, não
custa nada fazer uma tentativa de que cada dia seja mais especial que o outro.
Não só domingo. Hoje melhor que ontem, amanhã melhor que hoje, e depois e para
sempre!
DUDA
Clóvinho, eu sei...
CLÓVINHO
Eu sei que você vai dizer que é fácil eu falar. Eu
também tenho meus momentos ruins. Quem não tem um momento ruim, gente? Todo
mundo tem.
LAILA
Eu tenho também. Mas eu inventei um escudo super
protetor que nada mais pode abalar! É verdade, gente.
DUDA
(ri) Eu quero conseguir. Eu vou conseguir!
CLÓVINHO
Já que é assim! A festa não pode parar!
DUDA
NÃÃÃÃO! Sem festa! Acabou a festa! Acabou a
comemoração! Fim! Eu tô com dor de cabeça. Amanhã a gente tenta de novo, gente.
Tchau, finalizem sem mim. Preciso de um analgésico, é sério. (sai de cena) Nem
todo mundo consegue o tempo inteiro!
CENA
8
LAILA
O que? Ela saiu assim. Duda!
CLÓVINHO
Gente, tivemos um pequeno inesperado acontecimento,
que não deixa de ser especial, porque é meio constrangedor, e tem perigo de
ficar na memória por bastante tempo.
LAILA
O que a gente faz agora? Parece que ela não vai
voltar tão cedo.
CLÓVINHO
Como fazer pra que todo mundo tenha um dia especial
todos os dias? Mesmo nos dias ruins? Mesmo no hospital!
(silêncio)
LAILA
Eu não sei.
CLÓVINHO
Eu também não sei.
(eles se entristecem)
LAILA
Poxa vida. Não tem como tudo dar certo todo dia. Não
pode ter festa todo dia porque se não vira rotina e aí a gente nem repara mais
que é dia de festa.
CLÓVINHO
A gente não consegue deixar todo mundo feliz sempre.
Eu não sei o que fazer pra ajudar as pessoas, Laila.
LAILA
Acho que essa nossa aventura, a aventura da vida de
cada um, tem que ter dias felizes e dias tristes, pra gente poder aproveitar e
saber quando é um dia feliz.
CLÓVINHO
E parece que hoje é um dia triste. Bateu a bad de repente.
LAILA
Bateu a bad
em mim também.
CLÓVINHO E LAILA
Mas
a vida
Tem
coisas
Que
não tem como evitá-las
O
dia ruim
Pode
vir também
E nada
nos abala, sempre vem alguém
Pra
um carinho, uma conversinha
Meu
deus, mas cadê...?
(silêncio; os dois saem deixando um clima de
tristeza)
CENA
8
(Duda entra)
DUDA
Oi, gente! Hoje é um dia muito especial pra muitas
pessoas! Às vezes vai ter festa, às vezes vai ter bolo, às vezes vai ter música,
às vezes vai ter algodão doce e docinhos de amendoim...
(silêncio)
DUDA
Ué. O que aconteceu? Que clima é esse? Cadê todo
mundo?
(Clóvinho e Laila entram dramáticos)
CLÓVINHO E LAILA
Mas
a vida
Tem
coisas
Que
não tem como evitá-las...
DUDA
O que que é isso, gente?
LAILA
Você tinha razão, Duda. Não tem como a gente fazer
festa todo dia, toda hora. Não tem como ficar feliz vinte e quatro horas.
CLÓVINHO
É real. Nada daquilo faz sentido porque eu tô com uma
dor de barriga danada, sabe. Tô cagando vinte e quatro horas, isso sim. Tô tendo
um dia péssimo. Eu dormi sentado na privada! É sério!
LAILA
Eu também. Tô tendo um dia péssimo. Hoje não é meu
aniversário mais. Só daqui uns meses só. (chora)
CLÓVINHO
Calma, Laila, calma...
DUDA
Credo, gente. Que coisa. O que aconteceu com vocês?
CLÓVINHO
Eu acho que a gente tem que tentar. Mas tem que colocar
o pé no chão também. Você tinha razão.
LAILA
É, na vida real não tem essas maquiagens bonitas,
música, essas coisas, não.
CLÓVINHO
Na vida real a gente tenta fazer alguma coisa de
especial uma vez no mês, se der tempo do intestino ficar bom.
LAILA
É, na vida real tem gente que morre!
(grande tensão)
DUDA
Não, gente, calma, mas também não é assim. Pelo amor
de deus!
CLÓVINHO
Preciso tomar um remédio. Opa. Soltei um pum, gente,
desculpe. Tem vez que os dias são fedidos. (ele sai)
DUDA
Clóvinho, mas peraí!
LAILA
Eu também vou lá. Não tem nada pra fazer aqui. Me deu
um branco na cabeça. (ela sai)
DUDA
Gente, espera! Vocês não podem me deixar sozinha aqui!
Tem uma festa acontecendo, gente! (pausa) Ai, meu deus. Então. Bom. A gente...
continua a comemoração? É... Tive uma ideia! Vamo pintar a cara das crianças? Vem
você primeiro.
(Duda pinta a cara de uma criança com uma gota de
lágrima bem bonita)
DUDA
Nossa, credo! Eu não tô nada criativa hoje! Olha,
gente, eu fiz o menino chorando. Eu devia fazer ele feliz, né? Que boba eu. Próximo.
Vem você. (ela faz outra gota de lágrima) Ai, gente, credo! Eu só tô fazendo
lágrima de tristeza! Que coisa horrível! Espera um pouco. (pausa) Espera um
pouco, gente. (descobre) Sou eu. Fui eu. Os nossos sentimentos são iguais à
gripe, é um vírus. Se você não se proteger você pega. Se tem alguém feliz do
seu lado você fica feliz, se tem alguém triste você carrega com você toda essa
carga de energia também! Eu deixei esse clima de tristeza, gente. (pausa) Não. Isso
não vai acontecer nunca mais! (ela tira o desenho da lágrima das duas crianças)
Sem chororô, sem tristeza! Vamo enxugar e engolir tudo que tem de ruim! Porque
hoje é dia de festa de todo dia!
(luzes de show; Clóvinho e Laila surgem grandiosos,
porém tristes)
CLÓVINHO E LAILA
Mas
a vida
Tem
coisas
Que
não tem como evitá-las
DUDA
Não! Chega! Chega disso!
CLÓVINHO
Eu até tô me acostumando a ter uma vida como todo
mundo.
LAILA
Só a gente conhece as nossas próprias dores.
DUDA
Chega de melancolia! (Duda lambe a cara de Laila)
LAILA
O que é isso?
DUDA
Melancolia é toda essa tristeza, esse drama
existencial! (Duda lambe a cara de Clóvinho)
CLÓVINHO
Tá maluca, garota?
DUDA
Chega. Eu acabei de passar pra vocês um vírus super
potente! Tá na minha saliva e agora tá em vocês. Vocês não tem escolha! E não
existe remédio!
CLÓVINHO
Duda, pelo amor, eu já tô com caganeira, agora mais
essa! E eles rindo, olha lá!
DUDA
Sim! A gente pode tirar coisa boa até das coisas
ruins, sabia?
LAILA
De todas as coisas ruins?
DUDA
Alguns machucados vem às vezes pra nos ensinar
coisas. Por exemplo, às vezes você tá com caganeira porque comeu algo estragado
e fez mal. É seu corpo te avisando, cara!
CLÓVINHO
Nossa, sim! Isso é genial, Duda!
LAILA
Eu tava cansada de ficar interpretando que eu tô
triste, porque eu sou uma pessoa super feliz na minha vida real! Eu gosto de
comédia, não sei fazer drama.
CLÓVINHO
Eu tô sentindo o vírus fazer efeito! Tá sentindo?
LAILA
Ai, eu tô sentindo também. Olha que arrepio!
(Duda surge com uma arminha de água com os dizeres “Vírus
da Alegria”; ela joga água na plateia)
CLÓVINHO
Porque agora é a hora do show!
TODOS
Está
em qualquer poesia
Nos
filmes, nos livros e no tudo
O
tempo que passa num segundo
É
o tempo de montar a mesa.
Aquilo
que sonha a cabeça
Parece
mais livre no escuro
No
palco, na tela do mundo
Nem
sempre é sobre beleza.
História
de amor, realeza
Folclore,
terror, tá na mesa
É
um dia de comemoração.
Mamães
e vovós e os animais
O
dia de um santo ou dos pais
Hoje
é dia de todo dia
É
festa de todo dia
DUDA
E
a vida
Tem
coisas
Que
não tem como evitá-las
LAILA
O
dia ruim
Pode
vir também
CLÓVINHO
E nada
nos abala
Sempre
vem alguém
LAILA
Pra
um carinho
CLÓVINHO
Uma
conversinha
DUDA
E
a dor vai passaaaaaaar!
TODOS
Ficar
feliz vinte e quatro horas
DUDA
Eu
vou conseguir
TODOS
Eu
queria poder conseguir
E depois
a dor do que já passou
Que
se torna
Amor!
(black-out)
FIM
Nenhum comentário:
Postar um comentário